Emancipação Política


A EMANCIPAÇÃO POLÍTICA DE HUMILDES E OS DESDOBRAMENTOS DAS LEIS COMPLEMENTARES MUNICIPAIS
A emancipação política do distrito de Humildes é assunto que rende muitos comentários, desperta interesses, paixões políticas e traz à tona uma série de questionamentos, que não são recebidos com simpatia por parte de muitas pessoas, sobretudo, por aquelas mais diretamente interessadas no processo. Entretanto, oobjetivo deste texto não é o de agradar ou de desagradar quem quer que seja, tampouco de esgotar a discussão sobre o assunto, pretende sim, propor uma reflexão sobre o tema efomentar o debate, a fim de buscar uma alternativa viável para resolver a questão.
A priori, é preciso dizer que desde o ano de 2004, o distrito de Humildes vem perdendo territórios. Inicialmente, a Lei Complementar Municipal nº 019 de 01 de dezembro de 2004,em seu Art. 1º, Inc. II, alínea b, incorporou à zona industrial de Feira de Santana, a área que se inicia no viaduto do antigo ClubeCajueiro, englobando os dois lados da BR 324, até as imediações do antigo Clube Mendonça. Ou seja, desde o ano de 2004, queas terras onde atualmente, estão localizadas as indústrias Rigesa, Pepsico, Positiva Distribuidor Logístico e tantas outras, deixaram de pertencer a Humildes.
A posteriori, foi editada a Lei Complementar Municipal nº 45 de 2010, que altera a Lei anterior, e no seu Art. 2º, Inc. de I a IV, incorpora à sede do município de Feira de Santana toda a parte que se inicia na Avenida Artêmia Pires, no bairro do SIM, segue em direção ao Parque de Exposições, passa por trás da Yazak e vai até os limites com Coração de Maria e Conceição do Jacuípe. Com essa delimitação, foi criada a Zona de Predominância Residencial Quatro (ZR-4). Assim, Humildes perdeu outra parte considerável do seu território e os povoados de Bom Viver, Caboronga e Vila Fluminense também deixaram de pertencer ao referido distrito desde 2010, pois agora formam a citada ZR-4 de Feira de Santana.
Os limites não só do distrito de Humildes, mas de todos os demais distritos de Feira de Santana, foram fixados na Lei Complementar Municipal nº 075, de 20 de junho de 2013. Essa Lei no Art. 1º, Inc. V, ao estabelecer os limites do Distrito de Humildes, evidencia que o perímetro daquele distrito é muito menor do que se imagina. Nesse texto legal, Humildes se limita com o distrito sede, com São Gonçalo dos Campos e com o CIS BR 324, com isso, o referido distrito, apenas faz limites com Zona Industrial do CIS BR 324, haja vista que esta pertence à sede do município. Assim, nenhuma das unidades fabris localizadas nas margens da referida rodovia está dentro do território de Humildes, nem mesmo a Brasfrut, isso porque, 1km em linha reta, a contar da margem da BR 324, em direção ao povoado de Fulô, engloba até a mencionada fábrica de suco na zona industrial de Feira de Santana. Outro desdobramento considerável dessa Lei é o fato de retirar do território de Humildes, diversos povoados de notável importância, tanto do ponto de vista populacional, quanto para fins de arrecadação, taiscomo Terra Dura, Pau Seco, Ferrobilha, Jenipapo, Onça e Escoval. Este último, localizado numa faixa de terras que une as rodovias BR 324 e BR101, ou seja, caso a emancipação se consolide, essa área geograficamente importante para a economia do novo município, sobretudo, para fins logísticos, fora também retirada e incorporada ao novo perímetro urbano de Feira de Santana.
Por último, a Lei Complementar Municipal nº 080 de 12 de setembro de 2013, em consonância com a Lei Estadual 12.594 de outubro de 2012, amplia a Zona Industrial na BR 324. Conforme essa Lei, a área de terra localizada ao longo da BR 324, com 14,2Km de comprimento, a partir do viaduto Portal do Sertão, em direção a Salvador, até o viaduto com a BR 101, por 1km de largura para cada lado, a contar da faixa de domínio da rodovia,também fora incorporada à área destinada à industrialização em Feira de Santana. Dessa forma, o município zoneou seu território, e Humildes (até que seja resolvido o litígio entre Feira e São Gonçalo, no qual poderá perder ainda mais terras), passou a contar somente com Sapelba, Frifeira, dois postos de gasolina (localizados na BR 101) e o pequeno comércio local.
Fora essa situação geográfica e econômica, há ainda sérios problemas socioambientais, como por exemplo, o fato de Humildes atualmente não dispor mais de rios e lagoas que não estejam poluídos ou secos. Segundo relatos de alguns moradores, até a lagoa do Mendes secou e, de acordo com as pessoas que observam o fenômeno, tal fato ocorreu após a instalação nas proximidades da referida lagoa, de duas indústrias de grande porte, que vêm retirando água do lençol subterrâneo local. Isso evidencia que até a água de Humildes, que sempre foi de excelente qualidade e que, durante décadas, viabilizou as atividades econômicas ali desenvolvidas, encontra-se comprometida, porque as águas subterrâneas são finitas e não se sabe se o volume que vem sendo retirado em escala industrial é compatível com as condições de armazenamento do lençol subterrâneo. Vale ressaltar que, a Lei de Emancipação que será sancionada nos próximos dias, prevê que ter boas condições ambientais é pré-requisito para se emancipar qualquer distrito.
No âmbito social, o transporte coletivo de Humildes, assim como o do município como um todo, é de qualidade ruim. Isso reflete, sobretudo, na educação porque muitas pessoas do distrito não podem ir até a cidade para estudar à noite, visto que hoje não há transporte para retornar às suas casas, e há alguns anos atrás era porque, além de tudo isso, a passagem era bem mais cara que a do transporte da sede do município. Há também uma limitação da participação da comunidade em alguns eventos de cultura e lazer, pois devido à falta de um serviço de transporte público de qualidade e com horários regulares, a população de Humildes acaba por ser excluída de alguns eventos de mais qualidade. Além disso, muitas pessoas que residem na localidade precisam do transporte para se deslocar aos seus trabalhos em Feira de Santana. Então surgem as perguntas: Será que Humildes se tornando município, as pessoas não precisarão trabalhar em Feira? Ou terão um transporte de melhor qualidade para se deslocarem com esse fim? E o preço da passagem que passaria a ser controlado pela Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos e Transporte da Bahia (AGERBA), não tenderia a ficar ainda mais cara, como já ocorre em outros municípios próximos de Feira de Santana? Será que a emancipação resolveria esses problemas?
Ainda cabem outros questionamentos: se a Constituição Federal no Art. 30 garante competência e autonomia aos municípios para zonear território, organizar, criar e suprimir distritos, bem como, legislar sobre assuntos de interesses locais, que remédio jurídico será utilizado para reverter os atuais limites do distrito de Humildes, haja vista que todo o processo foi feito de forma constitucionalmente correta? Nem mesmo com o prefeito municipal poderia ser feito qualquer tipo de acordo, porque uma vez zoneado o território, as terras em questão foram incorporadas ao patrimônio do distrito sede, portanto, o executivo pouco pode intervir num processo de zoneamento concretizado. Por outro lado, isso alteraria todas as leis municipais anteriormente citadas que tratam do uso e ocupação do solo e de zoneamento territorial em Feira de Santana. Então, nessa conjuntura, reverter os atuais limites do distrito de Humildes é praticamente impossível.
Sendo assim, resta saber se vale à pena emancipar Humildes somente com o que sobrou e, se nessas condições, o novo município nascerá sustentável e se será capaz de oferecer serviços dignos à sua população. Há ainda algumas perguntas fundamentais: Será que o zoneamento territorial que município de Feira de Santana vem realizando desde o ano de 2004, não deveria ter sido feito, simplesmente porque Humildes, a exemplo do que ocorreu a mais de vinte anos, tenta mais uma vez se emancipar? E os políticos de Humildes e das redondezas que insistem em fomentar a tão sonhada emancipação política daquele distrito, mas que em sua maioria, sempre estiveram atrelados aos poderes executivo e legislativo municipal, porque não fizeram as intervenções necessárias para evitar os efeitos negativos que tal zoneamento traria para aquele distrito no caso de uma possível emancipação politica? Será que a única forma de enfrentar e resolver os problemas relacionados com a falta de infraestrutura, ausência de serviços públicos de qualidade em saúde, educação, transporte, saneamento ambiental, entre outros, só serão solucionados com a emancipação política? Não estaria na hora de a comunidade de Humildes se organizar para exigir do poder público o cumprimento de tais serviços?
Enfim, cabe à população, principalmente de Humildes, refletir sobre a realidade territorial, econômica, socioambiental e política daquela localidade para decidir sobre um possível processo emancipatório, isso porque mesmo sendo um distrito pujante, a realidade futura de um município criado com tantas limitações pode não ser tão interessante assim, como vem sendo propalado por todos aqueles que se declaram incondicionalmente favoráveis à emancipação politica de Humildes.

Josélia Campelo da Silva – Geógrafa e cidadã preocupada com a real situação de Humildes

FONTES:

Câmara Municipal de Feira de Santana. http://www.camarafeiradesantana.ba.gov.br/leis/leis-complementares-do-executivo.exe/view. Acessado em 21 set.2013.
Casa Civil da Bahia. http://www.legislabahia.ba.gov.br/Acessado em 21 set.2013
Prefeitura de Municipal de Feira de Santana. http://www.feiradesantana.ba.gov.br/website/leis.asp?acao=ir#links.Acessado em 19 ago.2013


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